Curso de Dança completa 10 anos e ganha novo projeto pedagógico

Avaliação positiva do MEC é motivo de comemoração

02/05/2017 11h00 - Atualizado em 03/05/2017 às 13h08
Noemi Loureiro, coordenadora do curso de Dança

Noemi Loureiro, coordenadora do curso de Dança

Simoneide Araujo – jornalista colaboradora

Criada em 2007, a licenciatura em Dança da Universidade Federal de Alagoas comemora a primeira década de funcionamento e contabiliza algumas conquistas do curso, como a avaliação positiva do Ministério da Educação e o novo olhar, o entendimento, sobre qual é seu papel. Dentro dessas conquistas também está o novo projeto pedagógico, que atualizou as ementas das disciplinas, trazendo mais contemporaneidade aos conteúdos numa vertente atual.

O curso tem quatro anos de duração e apenas uma entrada anual com 35 vagas. Funciona de segunda a sábado, das 7h30 às 12h50, no Espaço Cultural da Ufal, na Praça Sinimbu. Sua infraestrutura ainda é precária e o corpo docente se resume a quatro professores efetivos e um substituto. Para a coordenadora Noemi Loureiro, essas dificuldades são sanadas porque o curso usa muito a estrutura disponível na licenciatura em Teatro e também tem apoio de professores da Escola Técnica de Artes.

Ao todo são 89 alunos matriculados, mas muitos deles não frequentam regularmente as aulas. Segundo a coordenadora, a evasão é provocada, também, pela falta de condições financeiras de muitos estudantes. “Sem alimentação e sem dinheiro para pegar transporte fica difícil. O RU [Restaurante Universitário] é lá em cima no campus [A.C. Simões] e não dá tempo de eles conseguirem chegar na hora da refeição. Alguns até que conseguem o benefício, mas as aulas terminam às 12h50 e até que eles peguem o ônibus para chegar lá em cima, o restaurante já estará fechado. É difícil”, lamentou Noemi.

De acordo com o procurador Educacional Institucional, Tiago Cruz, os gestores da Universidade têm tido um olhar sensível às questões relacionadas a todos os cursos de artes. "A Gestão reconhece as graves condições de infraestrutura dos cursos de arte da Ufal. Ela são críticas, de fato, mas temos envidado esforços, dentro dos limites, pra tentar reverter essa situação. Uma ação concreta foi retomar as obras do antigo prédio da Residência Universitária Alagoana (RUA). Com previsão de entrega para dezembro deste ano, o local vai poder abrigar as atividades e dar uma melhor condição para os cursos", destacou. 

Cruz também ressalta que a nota do MEC já é um reflexo de algumas iniciativas. “Acreditamos que o conceito 3 tem relação com os impactos das medidas que a Gestão tomou, principalmente de suporte e apoio pedagógico. Por exemplo, desde que foi montado, o curso só tinha três professores da base, os demais são de outros departamentos, então a gente reconhece que há uma sobrecarga de trabalho deles. No entanto, fizemos concurso para professor efetivo e substituto, ou seja, tivemos um olhar sensível para a realidade do corpo docente. Também demos o suporte necessário para o projeto pedagógico e nos reunimos com o curso e com os estudantes sobre o processo de avaliação”, ressaltou.

Formação de professores

O curso é voltado para formação de professores. Segundo a coordenadora Noemi Loureiro, tudo começou com os docentes de Teatro, Telma César, Nara Sales e Antônio Lopes. “Eles sempre tiveram um viés para a dança e viram a necessidade de esse curso ser criado para atender à demanda existente. As pessoas procuravam um lugar para atuar com dança, pois o que havia eram os grupos de danças populares ou as escolas de balé. Por isso, o que esses docentes pretendiam era criar o curso de Dança no viés da licenciatura, para formação de professores que passariam atuar na escola básica. Assim como o Teatro que também tem licenciatura”, revelou.

No desenvolver desse processo de criação e implantação, a coordenadora relata que os docentes envolvidos começaram a perceber as necessidades para que, de fato, o curso fosse focado como uma licenciatura. “No início, as pessoas procuravam o curso porque gostavam de dançar e outras queriam aprimorar uma técnica específica. Não pensavam no curso como um lugar de formação para, globalmente, levar a dança para o processo de ensinamento na escola, como qualquer outra disciplina. O objetivo é trazer o conhecimento para formação do ser de forma integral”, disse Noemi.

No início, a entrada anual era com 45 vagas. “Conseguimos reduzir esse número e, agora, são 35. Já tivemos turmas concluintes com duas pessoas se graduando. Muitos desistiam porque descobriam que não era aquilo que procuravam. Isso também é importante porque elas percebiam e saiam. Desde 2010, percebemos que houve uma mudança no entender do que é ofertado pela Ufal. Quem procura o curso são pessoas que, de um modo geral, sabem que vão trabalhar com licenciatura. No entanto, temos cerca de 40% dos ingressantes que ainda procuram o curso pensando em aprender a dançar. No geral, a comunidade fora dos muros da Universidade ainda pensa no curso como um lugar somente do ensino do lúdico, não se vê como profissional que vai atuar dentro da escola básica”, completou Noemi.

Pelos registros da coordenação, ainda há uma evasão alta, mas quem fica para concluir o curso é porque quer trabalhar com dança. “Mais da metade de alunos que entram no curso, acaba desistindo e por várias razões. As pessoas que procuram nosso curso, normalmente, têm condição financeira baixa e não conseguem se manter no curso porque, às vezes, não tem dinheiro pra vir assistir aula e não há bolsas suficientes nem políticas na Universidade que atendam a essas demandas”, afirmou.

Para a coordenadora, o curso de Dança é sim um instrumento de formação. “Temos disciplinas pedagógicas e promovemos a formação integral. O profissional formado vai ter a consciência primeiro daquele ser e, especificamente, a pessoa entra no corpo e nas ações relacionadas ao movimento como complemento dessa consciência. O trabalho que realizamos no curso não é apenas de ações corporais; a gente entra com pesquisa e com uma consciência da formação integral do ser pra poder utilizar o corpo como subterfúgio do movimento e alcançar o que a gente pretende”, confirmou.

Abaixo, confira uma entrevista com a coordenadora que deu mais detalhes de como está o curso de licenciatura em Dança, sua importância para formação de quem vai atuar na escola básica e como está na avaliação do MEC.

Portal – Qual a importância da formação de um professor em Dança?

Noemi Loureiro – Essa é uma pergunta que eu tenho feito sempre: Qual a importância da dança na vida das pessoas? Porque se você não conseguir responder isso, quem está aqui no curso, por exemplo, é melhor procurar outra coisa para fazer na vida. Digo isso porque, primeiro, é importante encontrar em você o quê é e por que isso é relevante. Assim poderá entender por que isso é relevante para o outro. Como conquistar as pessoas que não estão no dia a dia da dança, não só no ambiente escolar, mas no cotidiano? Como convencer as pessoas que essa é uma profissão se nem eu mesma sei qual a importância disso. Para mim, que gosto e atuo nesse caminho, a dança é esse lugar da construção de valores que ficarão para o resto da vida na pessoa e não como um lugar apenas para o ensino da técnica. No nosso curso, não trabalhamos o valor estético; nosso objetivo é trabalhar o valor da formação integral do indivíduo, trazendo a dança justamente como esse elemento que vai unir as peças e, dentro desse contexto, tem o processo de conhecimento do seu corpo e do seu próprio ser.

– É um profissional que trabalha muito com a observação?

– Com certeza. Pra poder propor corporalmente ações, você tem de ter uma leitura e isso vai ser feito a partir do processo de observação visual e de um acompanhamento cinestésico. Trabalhar corporalmente o ser nas individualidades de cada um e que isso esteja conectado ao coletivo e, principalmente, à ação coletiva de valores éticos. Ações cotidianas onde a dança está inserida como esse elemento do prazer do encontro. As pessoas que terminam o curso não saem aptas para dar aula de balé ou qualquer outro tipo de dança; elas saem com a noção de que o balé, por exemplo, pode ser usado numa determinada necessidade do grupo a ser trabalhado.

– Nesses dez anos de funcionamento, o que o curso oferece?

– Oferece um plantel de possibilidades. Não diz como fazer; vai mostrar os caminhos usados para que nosso aluno ao se graduar possa trabalhar com dança, com olhar contemporâneo. Nosso curso atende a um público de várias idades, que entram, normalmente, com 16 anos, mas também temos um aluno que tem 81 anos. Seu Antônio [Alves] veio fazer o curso com interesse de difundir a dança de salão nas escolas. Ele não quer ser professor, mas quer divulgar esse trabalho com as novas gerações, dos benefícios que essa dança pode trazer pra quem a pratica. Ele é um grande exemplo de interesse do corpo que dança. A docência dele será através da divulgação dos benefícios que a dança de salão pode trazer para essa história da construção do ser integral. Isso é lindo porque ele é uma pessoa que tem deficits corporais, pela própria idade, e luta por isso; vive trabalhando pelas ações práticas que a dança oferece dentro do limite dele e tem conseguido. Ele é um grande exemplo para nós. Isso é uma grande vitória e uma quebra de paradigmas muito grande e acho isso super favorável, porque a gente no século 21 falando da construção integral do ser e quem é esse ser que a gente quer integralizar. Nós, docentes, também temos de ter nossos olhares ampliados para abarcar esse público. Nossa reflexão é voltada a saber como a dança ajuda a trabalhar a minha autoestima, o meu humor; como a dança vai trabalhar nessas entrelinhas. Esse é o lugar da licenciatura. Aqui no curso, a gente dá o norte; é a ponta do iceberg para que, objetivamente, o graduando desenvolva esses aspectos todos juntos, voltados para seu objetivo final, seja ele qual for. Aqui, nosso graduando não sai apto a dar aula de um determinado estilo de dança.

– O aluno do curso, necessariamente, é um dançarino, um bailarino?

– Não. E ainda bem que não. Digo isso porque nosso aluno tem de ter a cabeça aberta. Quando o aluno já vem com uma técnica especial, ele quer aprofundar e isso é muito complicado quando acontece. Quem vem sem formação nenhuma é muito melhor porque vamos construir juntos. Essa pessoa vai estar aberta para receber e para saber aplicar.

– Em relação ao mercado de trabalho, vocês têm essa noção se há demanda para absorver esses profissionais formados pela Ufal?

–Temos sim. A gente começa a dialogar com as escolas a partir do estágio dos nossos alunos. Antes não havia esse contato porque as escolas absorviam qualquer pessoa sem a formação adequada e, justamente, com o estágio supervisionado, os dirigentes das instituições de ensino começam a ver a importância do profissional que é mais qualificado, que tem knowhow de quem passou pela universidade, com mais possibilidade de atuar. Foi a partir desse momento, que passamos a receber solicitações das escolas para que encaminhássemos pessoas para trabalhar nessas empresas e instituições. O mercado tem uma demanda grande, mas não temos como atender. Nossos egressos são pouquíssimos. Também há a monitoria oferecida pela Semed [Secretaria Municipal de Educação]. Os alunos que entram nesse programa vão trabalhar pelo viés da dança e isso já abre portas. No entanto, no que se refere às políticas públicas, temos percebido que nos editais abertos aqui em Alagoas, a dança não é colocado no viés das artes. Por isso, estamos pleiteando nosso espaço.

– O curso está com um novo projeto pedagógico. O que é que muda?

– Recentemente tivemos a vista do MEC e, a partir do próximo período 2017.1, vamos trabalhar com a matriz antiga e a do novo projeto pedagógico. Com isso, teremos uma demanda maior, enquanto professores, e uma aceleração dos alunos que estão desperiodizados, que é a maioria. Com esse novo projeto, muda a estrutura das nossas disciplinas, com o aumento da quantidade de horas-aula e insere outras disciplinas que são relevantes, mas que não estavam contempladas. Agora, teremos disciplinas para atender a esse tempo hábil de cinco anos. Após uma década de funcionamento, o curso fez uma análise e apresentou uma nova proposta de ensino, ou seja, aprimoramos o projeto já existente.

– E qual a situação em relação ao MEC

– Tivemos uma aprovação, que considero boa, com nota 3,5. Digo isso por conta da nossa situação de estrutura física precária e do número insuficiente de docentes. Termos conseguido essa nota é a chance de atuar de uma maneira melhor e conseguimos isso porque pegamos carona na estrutura do curso de Teatro, que teve melhoras significativas porque também passou por avaliação do Ministério. E agradecemos muito ao curso de Teatro por nos dá essa oportunidade e por contribuir para que tivéssemos uma avaliação melhor.