Parabéns Museólogo: Ufal destaca o trabalho dos profissionais

Reorganização do acervo é desafio da nova servidora e passo importante para revitalização do Museu de História Natural

17/12/2014 12h52 - Atualizado em 17/12/2014 às 13h48
Cíntia Rodrigues é terceira museóloga contratada pela Ufal

Cíntia Rodrigues é terceira museóloga contratada pela Ufal

Pedro Barros - estudante de Jornalismo 

Eles não vivem de passado. O trabalho do museólogo continua presente para manter viva a memória da humanidade. Mas no caso da museóloga pernambucana Cíntia Rodrigues, recém-empossada como servidora do Museu de História Natural (MHN) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), a história é um pouco mais antiga: a datação do material guardado por essa instituição compreende eras geológicas, como um tronco fossilizado de 110 milhões de anos de existência. 

A contratação de Cíntia foi uma das principais conquistas do Museu em 2014. A especialista tem um importante papel na revitalização do equipamento cultural, que está em processo de reestruturação, com a mudança para o prédio do antigo Centro de Ciências Biológicas (CCBi), no bairro do Prado e a formulação de um novo regimento interno. 

Nesta quinta, 18, data em que se comemora o dia do museólogo, confira um pouco sobre essa profissão e sua contribuição para o MHN. Segundo a especialista, são tarefas de um museólogo atuar com comunicação e gestão de patrimônio, documentar, executar normas de aquisição, políticas culturais e principalmente como garantir o acesso do público ao trabalho de pesquisadores. "Meu trabalho em um museu de ciência é contribuir com a difusão do conhecimento para a população, traduzindo a linguagem científica e atuando na expografia [estudo da organização e apresentação da exposição]", explicou. 

"Existe o pesquisador que fica em seu laboratório, produzindo e pesquisando; só que às vezes, eles acham que todo mundo está entendendo o que eles falam. O museólogo tem de mostrar que, para a exposição, não é desse jeito. O que você vai levar, por exemplo, para um público de crianças e como você vai apresentar isso? Meu trabalho é justamente fazer essa mediação", salientou. "A técnica Carolina Padilha tem me ajudado nessa parte educativa, ela quem cuida dos meninos [risos]", acrescentou. 

Cíntia conta que o primeiro projeto no MHN, logo que ela chegou, foi organizar a Exposição Itinerante Biodiversidade de Alagoas: dos fósseis à vida atual, no Parque Municipal de Maceió. "Vamos ter que usar de artifícios como a exposição itinerante enquanto o salão do prédio ainda não está funcionando", afirmou. Para o diretor do MHN, Fábio Henrique de Menezes, melhorar a apresentação das exposições é apenas uma das contribuições da museologia. "O museólogo também pode contribuir muito com a forma de armazenamento e segurança do patrimônio", declarou. 

Acervo complexo 

A variedade de coleções do MHN pode ser dividida em quatro grandes áreas. A Zoologia, que envolve materiais provenientes de vários tipos de animais, desde moluscos e insetos até aves e mamíferos - sejam eles completos, partes (como ossos, órgãos etc.), ou ainda objetos ligados a eles (como soros contra o veneno de serpentes); Botânica, com diversas partes de plantas (folhas, flores, sementes, caules etc.); Geociências, que compreende rochas e fósseis; e, por fim a área de Arqueologia e Antropologia, que pode incluir desde esqueletos humanos até os artefatos produzidos por sociedades do passado. 

O principal foco do trabalho de Cíntia, atualmente, é organizar esse patrimônio complexo. Segundo ela, dois problemas estão bagunçando o acervo. O primeiro é que cada laboratório específico (de répteis, plantas, fósseis etc.) tem noção do que tem, mas não existe uma catalogação única e não se sabe ainda tudo o que pertence ao Museu. "Vamos documentar tudo o que existe nas coleções e ver como padronizar sua organização, de forma que tenhamos certeza do que é patrimônio nosso", comentou.

O acervo de um museu também pode se dividir em coleções científicas, de uso exclusivo para pesquisa, e coleções didáticas, para apresentação ao público. É aí onde está o segundo problema: sem a sala de exposição em funcionamento, muito do material didático acabou se misturando com o científico. Cíntia e a bióloga Selma Torquato, do setor de estudos sobre anfíbios e répteis do Museu, já estão analisando alguns sistemas de documentação. "Testamos um software e vimos que ele não comporta o acervo de arqueologia. O sistema deve ao mesmo tempo servir para todos os tipos de coleções e permitir que cada curador possa trabalhar com suas especificidades", explicou. 

Para o diretor do Museu, a catalogação biológica tem como principal preocupação o estudo das espécies. "O biólogo está preocupado com a biodiversidade, o local de ocorrência do animal, sua distribuição geográfica e outros dados com exatidão mais científica; a museóloga, por outro lado, pensa nesses animais em termos de coleção", explicou Fábio. Segundo Cíntia, o registro ideal é aquele em que tanto o pesquisador quanto o museólogo possam registrar e recuperar as informações. 

Reestruturação 

Em novembro, pesquisadores, curadores, técnicos e estagiários do MHN participaram de uma palestra com a museóloga Elizabeth Salgado, da Universidade Estadual de Santa Cruz. O objetivo foi aprofundar a equipe sobre o que são museus. "O que é educação em museu? O que é a mediação? O pesquisador também precisa ter noção disso", considerou Cíntia. 

A palestrante parabenizou a iniciativa. "Gostaria de agradecer à direção do Museu de História Natural, aos biólogos Fábio Henrique e Jorge Luiz, por acatarem a proposta da museóloga e da engenheira agrônoma Carolina Padilha, empenhadas em realizar o encontro", destacou. "Essa discussão pôde nos orientar sobre que medidas tomar agora. Eles ainda não estavam se sentindo muito museu, mas são museu", encorajou Cíntia. 

A contratação de uma museóloga e também de uma arqueóloga tem refletido o esforço da equipe do Museu de História Natural para sua reestruturação. Dois passos importantes, em processo, são a formulação de um novo regimento interno e a mudança para o prédio do antigo CCBi. O regimento já foi aprovado pelos membros do Museu e será levado para análise do Conselho Universitário.

Quem vive de passado... 

"Hoje posso dizer que adoro meu trabalho, com todo clichê da frase. Eu fui saindo aos poucos da educação no caráter mais formal (escola, sala de aula...) e fui para o museu, que também é um espaço de educação, que oferece várias possibilidades", disse Cíntia, que se formou inicialmente em Letras. É seu primeiro emprego. "Já trabalhei antes como bolsista, com arte contemporânea. É bem diferente, mas os princípios e linhas mestras da documentação são os mesmos. Temos uma infinidade de acervos; considerando que pode existir museus de tudo, eu aprendo muito com minha profissão", comemorou. 

Em Alagoas, ainda não há um curso de graduação em Museologia. Na Ufal, atuam outros dois graduados na área: Julio Chaves, do Museu Théo Brandão, e Tatiana Almeida, da Pinacoteca Universitária. "Quando dizemos que somos museólogos, tem gente que pede 'toca aqui um instrumento', pensam que a gente faz música", revelou. "Ainda há um estranhamento, muitos ainda não entendem nosso trabalho: 'você faz o quê mesmo?' E acho que cada vez mais as instituições devem contar com esse profissional", opinou. 

A importância de museus, segundo Elizabeth Salgado, é que seu acervo guarda a memória de um povo e um local. "É onde os saberes e fazeres são resultantes de relações culturais entre pessoas, natureza e cultura. Um Museu de Ciências apresenta uma vária gama de conhecimentos específicos que traduzem o modo de viver, sentir, operar, agregar e reabilitar sistemas diversos de compreensão do existir no planeta Terra. Para quê? Para compreender a existência humana, na sua essência", ressaltou. 

Para Cíntia, o museu não é um lugar para guardar tudo o que não queremos lembrar, sem acrescentar nada para a sociedade. "Museu é memória. A gente preserva e garante que todos tenham acesso a informação. Se algo está no museu é porque há uma necessidade de preservar e garantir acesso para pesquisa e discussão do que se está guardando. Museu não é depósito, é instituição de pesquisa, de educação e conhecimento; não é espaço só de passado, ele tem que conversar com o presente sempre", concluiu.